O Exagero

November 2, 2025

O Exagero

November 2, 2025

    O problema da humanidade, na minha opinião, é o exagero. Não acredita? Pense bem. É ceia de Natal, e você quer provar todos os pratos. Mas não quer apenas saborear as iguarias, quer comer muito, comer com vontade. No dia seguinte, se arrepende: “Por que fui comer tanto?! E a dieta?!”. Pois é, era só ter comido com moderação, mas nós, seres humanos normais, não somos moderados, exageramos em quase tudo, com força e vontade. Não basta um chopinho no happy hour, mas queremos 5 ou 10. Não basta passar férias na praia, mas queremos descer a serra no dia 31 de dezembro com as crianças, o cachorro, os sogros e não ficar parados cinco horas no engarrafamento. Não é suficiente pintar o cabelo para cobrir os fios brancos, mas ainda queremos mechas acaju e um acobreado nas pontas. Não é suficiente comprar um carro, ainda fazemos um financiamento de 72 meses. Quando terminamos de pagar as prestações, o carro já está bem rodado e queremos comprar outro. 

O leitor já entendeu a ideia, o que afunda a humanidade é o excesso. E não serve qualquer poça de água para nos afundar, não senhor! Estamos providenciando o degelo das calotas polares para colocar metade das cidades litorâneas embaixo d’água. E por aí vamos.

A maior discrepância é que somos tentados ao exagero, mas o mundo é feito para as pessoas medianas. Você calça 46 bico largo, ou 33, e não encontra sapato nenhum que te sirva. Tem 1,90 de altura e simplesmente não cabe na poltrona do avião, do ônibus e nem do fusca, carro que foi criado pensado na população mediana alemã. O Big Mac é feito para uma pessoa mais ou menos normal saciar a fome, mas ainda pede a batata e a Coca-Cola grandes. A economia, a arquitetura e tudo o mais são feitos pensado no ser humano “típico”, “padrão”. O resto que se dane. Geralmente esse “resto” tem a ver com você. O atendimento online de qualquer companhia é feito estrategicamente para resolver qualquer problema em menos de cinco minutos, mas você, evidentemente, não é qualquer um. Então briga com o computador, a atendente, a recepcionista, pede para falar com o gerente e depois de uma hora se dá conta de que ligou para a empresa errada. Decide tomar vitamina C para ajudar na imunidade, mas espera que um comprimido ao dia te faça imortal. Precisa baixar o colesterol e entrar em forma, mas acha que no terceiro dia comendo brócolis e peito de frango já está pronto para as Olimpíadas. Deixa para comprar a final do Fla-Flu na véspera e acha que vai encontrar ingresso com desconto. Desejamos que o mundo atenda às nossas demandas, mas queremos o exagero, o excesso, o fora da curva. Vivemos de expectativas, mas a realidade não está nem aí com a gente, nem um pouquinho, não mesmo. Vai pedir aumento e espera encontrar o chefe com bom humor e generoso, mas ele não se importa que você ainda está pagando as parcelas do fusca e que as férias na praia estouraram o orçamento. Arruma um papagaio e espera que ele cante o Hino Nacional em menos de uma semana. A lista é infinita. Aquele que sabe adequar suas expectativas à realidade é a pessoa mais feliz do mundo, mas sem exagero, é claro.