Que atire a primeira pedra quem nunca ficou bêbado! Eu mesma não posso atirar nem rolha de prosecco, já tive alguns episódios de exagero etílico, mas ficaram lá atrás (muito atrás, na verdade) durante minha vida de universitária. Para mim, as condições financeiras sempre foram um fator limitante. Via de regra, universitário é um ser desprovido de recursos financeiros, e a bebida costuma ser cara. Acredito que a pindaíba dos universitários é um fator importante para a sua sobriedade ocasional, o que, de certa forma, é um desperdício. Quando se é jovem, o álcool não traz tantos prejuízos, pois o corpo acompanha razoavelmente os desvarios da cabeça e os descontroles da alma. Acordou, toma uma ducha, um cafezinho e já está pronto para a aula de Estatística 2. O problema vem com a idade.
Quando se é mais velho, com diploma e emprego fixo, pode se dar ao luxo de entrar no maravilhoso mundo dos vinhos chilenos, das cervejas artesanais e dos uísques escoceses. Melhor dizendo: a idade eleva a degustação etílica a outro patamar, o bolso dá conta de pagar a conta no bar, mas o corpo te abandona. Na segunda taça, você começa a falar mole; na quarta rodada, está filosofando e contestando a harmonia do universo transcendental (com muita convicção); e na sexta, é declarada perda total. Não adianta argumentar, prometer detox e abstinência; o corpo não colabora. No dia seguinte, você está no mais baixo nível da existência humana. Era melhor ter deixado o universo em paz e nem ter aberto a garrafa.
Para aliviar o miserê dos que gostam de beber e não têm dinheiro, e incentivar a degradação física e moral dos menos afortunados, inventaram o corote e, consequentemente, a ressaca épica que ele proporciona. O corote é, basicamente, a mistura de três ingredientes: aguardente, suco de frutas artificial e um dia de muita ressaca (misturada com o arrependimento e a espera pelo juízo final, sem passar pela extrema-unção).
A idade também limita quando se vai beber, geralmente apenas um dia por semana – talvez dois, se tiver feriado nacional – e se o filho adolescente sair de casa com a namorada, pois não pode dar o exemplo. Antes bebíamos escondidos dos pais; hoje bebemos escondidos dos filhos. E também do chefe, do cliente, do vizinho, do cardiologista, da nutricionista, do advogado e do padre.
Também não vamos mais aos bares por causa da Lei Seca, que, aliás, foi a melhor conquista para a segurança no trânsito. Estamos acostumados a beber em casa, na companhia de alguns poucos e bons copos, quer dizer, amigos. Já não bebemos com desconhecidos nos bares para socializar, bebemos para fortalecer os laços de amizade com pessoas que bebem o mesmo que nós, se tivermos sorte. Descobri que prefiro vinho branco, o tinto me dá insônia, mas minhas amigas são fiéis aos cabernet sauvignon. Já no começo do carteado, sempre tem alguém que fala: “Alguém pode buscar uma garrafa de chardonnay só para a Raquel?”, e todas me olham com reprovação, como se eu fosse um alienígena e indigna de sorver a bebida consagrada a Baco na sua companhia. Ou seja, minha preferência alcoólica é usada para o bullying. Para dizer a verdade, o fato de ser péssima jogadora de tranca também não colabora. Pensando bem, talvez eu devesse trocar de amigas. Ou parar de beber.